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Hiperligações: Ato de comunicação ao público?

PUBLICAÇÕES SÉRVULO 30 Set 2016

O acórdão GS Media BV vs. Sanoma Media Netherlands BV e Outros

 

A 8 de setembro de 2016, o Tribunal de Justiça, no âmbito de um reenvio prejudicial, proferiu um acórdão[1] referente ao modo como deve ser interpretado o conceito de “comunicação ao público”, vertido na Diretiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação[2] (artigo 3.º, n.º 1), num caso em que um blog noticioso disponibilizou hiperligações para obras protegidas por direitos de autor, disponíveis noutra página sem a autorização do titular dos direitos.

Por encomenda de uma editora, C. Hermès fotografou uma conhecida apresentadora holandesa, destinando-se as fotografias à edição de dezembro de 2011 da revista Playboy. Antes da publicação da revista, em outubro, o blog recebeu uma mensagem anónima com uma hiperligação para um ficheiro disponível online que continha tais fotos.

Subsequentemente, a editora intimou o blog para que este não publicasse as fotografias, ao que este não acedeu, publicando um artigo com um link para as mesmas no dia seguinte. Quando este deixou (por intervenção da editora) de conter as fotos, o blog publicou dois novos artigos, um a seguir ao outro, com outros links para as mesmas. 

De seguida, a sociedade responsável pelo blog foi acionada, encontrando-se o processo atualmente a correr os seus termos no Tribunal Supremo dos Países Baixos, que suspendeu a instância e submeteu ao Tribunal de Justiça questões prejudiciais, tendo em vista saber, em resumo, se, e em que circunstâncias, o facto de se colocar num website uma hiperligação para obras protegidas, disponíveis numa outra página, sem a autorização do titular dos direitos de autor, é ato de «comunicação ao público» na aceção da Diretiva, e se, portanto, constitui uma violação de direitos de autor. Refira-se que cabe ao(s) titular(es) destes direitos autorizar ou proibir qualquer comunicação ao público das suas obras. Questiona ainda a relevância i) de a obra ainda não ter sido, à data, comunicada ao público com a autorização do titular do direito, ii) do conhecimento dessa falta de autorização por parte de quem disponibiliza o link e iii) do facto de a disponibilização do link facilitar a descoberta do conteúdo por parte do público.

De acordo com o parecer do advogado-geral Melchior Wathelet – cuja proposta de resposta não foi acolhida pelo Tribunal – não há aqui qualquer ato de comunicação ao público, sendo irrelevante o conhecimento da falta de autorização por parte de quem disponibiliza a hiperligação, tal como o facto de o acesso a estes conteúdos ser facilitado em virtude da disponibilização do mesmo.

Contrariamente, segundo o Tribunal de Justiça, provando-se que quem disponibilizou o link sabia (ou tinha obrigação de saber) que este dava acesso a obra ilicitamente publicada, é de considerar existir “comunicação ao público”, havendo uma presunção de que o responsável conhecia esta realidade (presunção que lhe cabe ilidir), sempre que a obra seja disponibilizada no âmbito de atividade com fins lucrativos.

Desta conclusão decorre que os titulares dos direitos estão legitimados não só a agir contra quem disponibiliza o conteúdo sem autorização, mas também contra quem disponibiliza hiperligações para a mesma.

É certo que este acórdão respeita apenas a conteúdo publicado ilicitamente (dado que hiperligações para conteúdo disponibilizado legitimamente não são consideradas “comunicação ao publico” para este efeito – cfr. acórdão Svensson, de 13 de fevereiro de 2014 – C‑466/12, EU:C:2014:76), e que este entendimento tem consequências apenas para quem explora a sua atividade com fins lucrativos. De todo o modo, cumpre refletir sobre as implicações, por um lado, no que respeita à liberdade de expressão, podendo no limite estar aberta a porta para uma forma de censura (por exemplo, quanto se trate de notícias que remetam para fugas de informação, como temos vindo a assistir recentemente) e, por outro, na dificuldade em verificar se um dado conteúdo foi publicado de modo legítimo ou não (ainda mais tendo em conta que o conteúdo para o qual remete o hiperlink pode ser alterado a qualquer momento, sem aviso prévio).

Ainda assim, em virtude desta decisão, todos os que têm websites com finalidades lucrativas devem diligenciar no sentido de verificar assiduamente a licitude da disponibilização dos conteúdos para os quais remetem através de hiperligações - pese embora a dificuldade de tal tarefa -, sendo conveniente a remoção de tais links sempre que sejam legitimamente instados pelo titular dos direitos a fazê-lo.



[1] Processo C‑160/15.

[2] JO 2001, L 167.

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