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…Quid Iuris?

SÉRVULO NA IMPRENSA 23 Jun 2017 in Jornal Económico (Online)

Um trabalhador acede ao Facebook durante o horário de trabalho e no local de trabalho e publica um post de conteúdo ofensivo, que denigre a imagem do seu superior hierárquico. É possível recorrer à ação disciplinar? 
 
Com a celebração de um contrato de trabalho há compressão dos direitos de personalidade do trabalhador, desde logo por este passar a estar sujeito à subordinação jurídica (traduzida na sujeição ao poder de direção e ao poder disciplinar do empregador, o que permite a este último agir disciplinarmente quando o trabalhador pratique uma infração disciplinar por violação dos deveres laborais a que está sujeito). Claro que tal compressão de direitos deve limitar-se apenas ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos do empregador. 
 
Feito este enquadramento, a resposta à questão acima passará sempre por uma análise casuística e da obtenção de resposta afirmativa às seguintes perguntas: 
 
Existe poder disciplinar? Estando em contexto laboral, existe subordinação jurídica, e, em consequência, existe poder disciplinar. 
 
Haverá infração disciplinar? No caso, a infração disciplinar está consubstanciada na violação dos deveres de zelo e diligência e de urbanidade. 
 
Apesar de haver violação destes deveres, posso punir? A primeira reflexão a fazer é sobre o conflito entre direito à liberdade de expressão, direito à confidencialidade das mensagens do trabalhador e direitos de personalidade do empregador. Em relação à liberdade de expressão e de opinião, a mesma é reconhecida no âmbito da empresa. Quer isto dizer que a mesma pode ser manifestada a propósito de questões conexas com o trabalho. Porém, existem dois limites: o respeito pelos direitos de personalidade da outra parte (trabalhador ou empregador) e o respeito pelo normal funcionamento da empresa. Assim, não será lícito ao trabalhador, em nome da liberdade de expressão e de opinião, injuriar ou difamar um colega de trabalho ou o empregador. 
 
Em relação à confidencialidade de mensagens e de acesso a informação, há que fazer a distinção entre mensagens de natureza pessoal e profissional. Para tal, deverá ter-se em consideração o tipo de serviço utilizado, a matéria das publicações, a parametrização da conta, os membros da rede social e o número de amigos ou de membros do grupo. Através da conjugação destes fatores, os tribunais têm aferido se existe legítima expectativa de privacidade do trabalhador.  
 
A tendência dominante considera que a partir do momento em que são feitas publicações numa página de uma rede social, tais publicações são suscetíveis de vir a ser conhecidas e partilhadas, inexistindo expetativa de privacidade. Assim, não tendo natureza pessoal, não fica abrangida pelo direito ao sigilo. Em suma, em contexto laboral, percorridos todos estes passos, a conclusão é a de que o que publicamos no Facebook, no horário e local de trabalho, pode ter implicações laborais e ser punido disciplinarmente.

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