A viragem LegalTech
SÉRVULO NA IMPRENSA 17 Set 2025 in Iberian Lawyer
As ferramentas de inteligência artificial estão já a transformar a prática diária das sociedades de advogados. A revolução tecnológica tornou-se uma preocupação central no setor jurídico. A questão já não é se a inteligência artificial deve ser adotada, mas sim quando — e com que rapidez. Existe um consenso crescente de que a tecnologia desempenha um papel decisivo no sucesso ou fracasso de uma sociedade de advogados. Ferramentas que melhoram a eficiência, reduzem custos, automatizam tarefas e permitem análises preditivas estão a impulsionar o crescimento do mercado de legaltech com IA, numa altura em que as sociedades procuram dar resposta à crescente pressão por soluções ágeis e orientadas por dados.
Segundo a Market Research Intellect, o mercado global de legaltech foi avaliado em 2,5 mil milhões de dólares em 2024, prevendo-se que atinja os 8,5 mil milhões de dólares até 2031. Impulsionado pela inovação de produto, aplicação intersectorial, objetivos de sustentabilidade e um crescente interesse por parte de investidores, o mercado é liderado pela América do Norte (com mais de 40% de quota) e pela Europa (30%), de acordo com a Cognitive Market Research.
Após seis meses a observar o trabalho diário na Sérvulo & Associados, André Dionísio, cofundador e CEO da ByTheLaw, e a sua equipa, identificaram a gestão interna de conhecimento como um dos principais obstáculos. A empresa desenvolveu, então, um sistema baseado em IA que organiza automaticamente a informação jurídica interna, reduzindo o tempo gasto em tarefas administrativas não faturáveis. “O conhecimento é o ativo mais valioso das sociedades de advogados”, afirma Dionísio.
A ByTheLaw estima que a sua ferramenta atualmente permite poupar cerca de 63 horas por utilizador por ano — um número que a empresa acredita poder multiplicar até dez vezes nos próximos anos.
Desafios e perspetivas
Apesar da crescente implementação, o setor legaltech pode enfrentar desafios estruturais. A complexidade regulatória — incluindo a incerteza em torno do futuro Regulamento Europeu de Inteligência Artificial — é uma das preocupações. Outros desafios incluem, especificamente em Portugal, quadros laborais rígidos, questões fiscais, uma escassez de talento qualificado e a falta de clareza quanto ao enquadramento regulatório nacional. “Os motores de busca e ferramentas utilizadas no setor público e nos tribunais estão tão desatualizados que os profissionais acabam muitas vezes por recorrer ao Google”, observa Dionísio. Defende-se um maior diálogo entre o Direito e a Engenharia: “Precisamos de perfis híbridos — engenheiros que compreendam o Direito, e juristas que compreendam a tecnologia.”
A ByTheLaw está a desenvolver soluções adaptáveis a outros sistemas jurídicos e identifica uma oportunidade particular nos países lusófonos, como o Brasil. O objetivo, afirma Dionísio, é colaborar com parceiros internacionais para validar localmente as suas ferramentas. Apesar dos obstáculos, a perspetiva é otimista. À medida que as capacidades da IA evoluem e se alinham cada vez mais com o trabalho jurídico, espera-se uma nova vaga de inovação que irá transformar o panorama no sul da Europa.