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A última lição de Direito do Professor Sérvulo Correia

NOTÍCIAS E EVENTOS 10 Mai 2008

Faculdade recupera homenagens a académicos jubilados 
 
(LUÍS NAVES - Diário de Notícias) 
 
"Não fui praxado à entrada, sou praxado à saída", dizia Sérvulo Correia, sorrindo com a auto-ironia, pouco antes da sua última lição, ontem, na Faculdade de Direito de Lisboa.A expressão era serena, mas o académico confessou ao DN que vivia um "momento de alguma emoção". E, ao longo do belo discurso de 35 minutos, as emoções contidas vieram à superfície por diversas vezes. 
 
A despedida académica do professor de Direito e advogado Sérvulo Correia foi também o recomeço de uma tradição. Como explicou ao DN o presidente do Conselho Científico da Faculdade de Direito de Lisboa, Marcelo Rebelo de Sousa, esta foi a primeira das últimas lições dos professores da escola, após anos de interrupção da prática. 
 
A última lição de Sérvulo Correia foi uma narrativa nostálgica sobre o seu percurso. O professor evocou muitas pessoas: os mestres, a família, a guerra colonial e a morte do melhor amigo. E havia uma sabedoria profunda no que era dito, por vezes comovidamente. A última lição foi também o retrato de uma geração, de um grupo de caloiros cheios de ilusões, que chegaram à Faculdade do Campo de Santana em Outubro de 1954 e eram "chamados senhores doutores nos cafés vizinhos". Não houve praxes, pois estas pertenciam, na época, a Coimbra. 
 
"O sistema de exames era de uma terrífica violência", explicou o professor, ao descrever a dureza dos testes, a severidade e exigências dos professores do seu tempo, a vastíssima cultura dos alunos e docentes. O saber estruturava-se ainda na escola primária e a auto-exigência era muito elevada. Sérvulo Correia evocou os seus gostos literários, a escola primária, os soldados que comandou na Guiné, onde combateu a partir de Dezembro de 1960. 
 
O professor de Direito foi mobilizado para a guerra por "erro", um detalhe que o próprio não incluiu na última lição. Poderia ter adiado a mobilização, para concluir o mestrado, mas escolheu não o fazer. Seguiramse três anos de Guiné, durante os quais morreu o seu amigo José Carlos Ferreira de Almeida, outro aluno brilhante do curso de Direito, vítima de um acidente de jipe, durante um reconhecimento. 
 
Os soldados, a morte do amigo, foram as únicas referências ao conflito. Sérvulo Correia não falou de si, mas da necessidade da Faculdade de Direito de homenagear os seus antigos alunos mortos em combate na guerra colonial. 
 
Um amigo, António Dias da Cunha, explicou ao DN que Sérvulo Correia "é uma pessoa muito séria e rigorosa, que acredita em valores". Houve também discursos a sublinhar os feitos académicos e na área do Direito. Mas a súmula da última saudação de Sérvulo Correia enquanto professor no activo é, no final, a da "trágica grandeza" de uma geração que, tal como todas as outras gerações, teve algures de perder a sua inocência. 

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