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Acórdão de Fixação de Jurisprudência N.º 8/2017

PUBLICAÇÕES SÉRVULO 09 Mar 2018

O Supremo Tribunal de Justiça proferiu acórdão que fixou a seguinte jurisprudência: «[a]s declarações para memória futura, prestadas nos termos do artigo 271.º do Código de Processo Penal, não têm de ser obrigatoriamente lidas em audiência de julgamento para que possam ser tomadas em conta e constituir prova validamente utilizável para a formação da convicção do tribunal, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 355.º e 356.º, n.º 2, alínea a) do mesmo Código».

 Em regra, só podem concorrer para a formação do tribunal provas produzidas ou examinadas em audiência – vide artigo 355.º, n.º 1 do Código de Processo Penal (“CPP”). Não obstante, o princípio da imediação é excecionado na medida em que se admite a leitura, visualização ou audição em audiência de prova contida em atos processuais, nomeadamente, declarações para memória futura, previstas no artigo 271.º do CPP – nos termos dos artigos 355.º, n.º 2 e 356.º do CPP.

 O tema que recebe interpretação divergente na jurisprudência e é objeto do acórdão prende-se com saber se a faculdade de leitura das declarações (para memória futura) em audiência é, em bom rigor, obrigatória para que as mesmas possam ser valoradas pelo tribunal.

 Em sentido positivo, a maioria da doutrina e jurisprudência dos Tribunais da Relação defende que essa leitura «visa suprir a ausência da pessoa declarante, e é assim uma exigência inelutável dos princípios da imediação, da oralidade, do contraditório e da publicidade

Em sentido negativo, a jurisprudência maioritária do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal Constitucional entende não ser obrigatória a leitura desde que as declarações «tenham sido prestadas no respeito pela estrutura acusatória do processo e pelo contraditório».

 O acórdão de fixação de jurisprudência, com quatro votos de vencido, decidiu que a leitura das declarações constitui uma mera faculdade, com a seguinte fundamentação:

  • Da interpretação literal conjugada das disposições supra referidas não resulta – de forma explícita ou implícita – a obrigatoriedade de leitura das declarações, donde seria contraditório fazer depender a validade dessa prova da sua leitura em audiência;
  • As declarações para memória futura são prestadas perante o juiz de instrução, com presença do defensor do arguido e do Ministério Público, permitindo um contacto directo com a fonte da prova e um debate oral entre os últimos perante o primeiro;
  • Se é verdade que não se verifica imediação entre o declarante e o juiz de julgamento no ato de tomadas das declarações, verdade é também que o tribunal, para formar a sua convicção, tem de recorrer à audição/reprodução das declarações para, em conexão com a demais prova, poder valorá-la;
  • O regime da prova pessoal antecipada constitui uma exceção à imediação, dado o receio de perda da prova, mas não sai mitigado o princípio pela leitura das declarações em audiência, uma vez que continua a não ser possível o contacto do juiz de julgamento com o declarante;
  • Também o princípio do contraditório não sai prejudicado, atento que são dadas ao arguido todas as efetivas possibilidades de discutir, contestar e valorar as mesmas declarações, nomeadamente durante as inquirições e em audiência de julgamento.

Como bem mostram os votos de vencido, a decisão ora descrita é tudo menos consensual, sendo passível de colocar problemas de aplicação ao julgador, na medida em que, em certa medida, pode ser interpretada no sentido de colidir com o regime fixado na lei processual penal acerca desta matéria.

  

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