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Videovigilância e Inteligência Artificial: O chumbo da CNPD

PUBLICAÇÕES SÉRVULO 17 Jan 2020

A 27 de dezembro de 2019 a Comissão Nacional de Proteção de Dados («C.N.P.D.») emitiu dois pareceres onde rejeita a utilização, em sistemas de videovigilância, de tecnologias de inteligência artificial e aprendizagem automática,nas cidades de Portimão e Leiria. Estes projetos foram submetidos à consideração da C.N.P.D. pela Polícia de Segurança Pública («P.S.P.») após despacho do Ministério da Administração Interna. 

O projeto de Portimão previa a instalação de 61 câmaras de videovigilância, sendo que 10 delas seriam instaladas na cidade e 51 na Praia da Rocha, o que considerou a C.N.P.D. «abranger praticamente toda a praia» e onde as pessoas se encontrariam tendencialmente mais expostas, motivo pelo qual se exigem maiores cautelas. Em Leiria o cenário seria um pouco diferente visto já existirem 19 câmaras de videovigilância, pretendendo o projeto incluir mais 42 câmaras. 

O recurso à captação de imagens de videovigilância é um tratamento de dados pessoais que deve respeitar a Diretiva (EU) 2016/680 do Parlamento Europeu e do Conselho de 27 de julho de 2016 (sobre proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas autoridades competentes para efeitos de prevenção, investigação, deteção ou repressão de infrações penais ou execução de sanções penais, e à livre circulação desses dados) a qual dispõe que as atividades de videovigilância são possíveis nos casos de prevenção, investigação, deteção ou repressão de infrações penais ou execução de sanções penais, incluindo a salvaguarda e a prevenção de ameaças à segurança pública, desde que estejam previstas na lei e constituam uma medida necessária e proporcionada numa sociedade democrática, tendo devidamente em conta os interesses legítimos da pessoa singular em causa. 

Ora, o objetivo da implementação deste novo sistema de videovigilância seria a prevenção e repressão criminal, a gestão de tráfego ou a prevenção de acidentes rodoviários. Mas, em ambas as cidades, entende a C.N.P.D. que estão em causa sistemas de videovigilância que permitem «captar, em todas as direções e com grande acuidade, imagens de pessoas e veículos, a que acresce a possibilidade de captação de som», promovendo o «rastreamento das pessoas e dos seus comportamentos e hábitos, bem como a identificação das pessoas a partir de dados relativos a características físicas». 

Tanto no caso de Leiria como no de Portimão, a argumentação utilizada pela C.N.P.D. para o chumbo foi idêntica, focando-se essencialmente na afetação da vida privada das pessoas que circulem ou se encontrem nestes concelhos e o impacto destas tecnologias de videovigilância sobre os direitos fundamentais dos titulares de dados pessoais. Entendeu a C.N.P.D. que um sistema de videovigilância com as características já mencionadas representaria um «elevado risco para a privacidade dos cidadãos, não só pela quantidade e pelo tipo de informação que é possível recolher (…) mas também pela opacidade de que se reveste o processo de definição de padrões de análise e a deteção» visto não existir uma fundamentação suficiente por parte da P.S.P. quanto aos filtros e «máscaras digitais» que seriam usados para proteger a intimidade e a vida privada.  

Assumindo uma postura cautelosa, a C.N.P.D. fez saber que a utilização de sistemas de videovigilância que recorram à inteligência artificial deve ser precedida de uma «ponderação especialmente rigorosa». Todavia, os dois pareceres emitidos também não se tratam de uma recusa absoluta da utilização deste tipo de sistemas.

Catarina Mira Lança

cml@servulo.com

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