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Aprendizagens covidianas: o Regulamento (UE) 2021/522 e uma Europa mais resiliente na área da Saúde

PUBLICAÇÕES SÉRVULO 01 Abr 2021

Com a Europa (e o Mundo) a viver há mais de um ano numa realidade que, outrora, apenas concebíamos como algo possível em séculos passados ou num futuro distópico, a verdade cada vez mais evidente é que a Covid-19 continuará a deixar a sua marca de forma transversal. O atual contexto pandémico veio deixar a nu o facto de que poderão suceder-se outras crises sanitárias e, assim, urge garantir a futura prevenção e combate a situações semelhantes, como bem reconhece o recente Regulamento (UE) 2021/522 que cria o Programa UE pela Saúde para o período 2021-2027.

Se estes programas não constituem novidade – durante o período 2014-2020 vigorou o Regulamento (UE) n.º 2014/282 -, também é verdade que o passo ora dado pela União Europeia, mantendo-se altamente limitado pela reserva de atribuição dos Estados membros em matéria de prestação de cuidados de saúde, apela a uma proteção da “saúde pública num espírito de solidariedade europeia (…) A experiência adquirida com a atual crise de COVID-19 demonstrou a necessidade de mais ações a nível da União para apoiar a cooperação e a coordenação entre os Estados-Membros”. É, pois, neste limbo de difícil equilíbrio entre os limites à partilha de poderes queridos pelos Estados membros e a evidência da vantagem de uma atuação mais forte da União na resposta a tais crises, que surge o Regulamento (UE) 2021/522.

O primeiro sinal é o aumento do quadro financeiro do Programa, que sobe de €449 394 000 (2014-2020) para €2 446 000 000 (2021-2027): mais de 400%. E o segundo é a ampliação significativa dos objetivos e das ações elegíveis.

Entre os objetivos gerais consta, naturalmente, o reforço da capacidade dos sistemas de saúde dos Estados membros, sobretudo face a ameaças transfronteiriças graves para a saúde; mas também a melhoria da “disponibilidade, do acesso e da acessibilidade de preço de medicamentos, dispositivos médicos e produtos relevantes em situação de crise, e apoio à inovação relativa a esses produtos”. Assinalam-se também, entre os objetivos específicos, a aposta numa estrutura e organização de formação para uma reserva de profissionais de saúde a serem disponibilizados e mobilizados em caso de crise sanitária ou na intenção de garantir melhores acessos a cuidados de saúde e a serviços conexos com o fito de assegurar uma cobertura universal de saúde.

Através da definição destes objetivos gerais e específicos, a UE dá sinais claros, tanto ao sector público como ao privado, do que considera deverem ser as prioridades de investimento ao nível da União, complementar às políticas internas dos Estados membros.

Uma das disposições que, eventualmente, melhor espelha as aprendizagens covidianas é o artigo 9.º, que visa regular a contratação pública em situações de emergência sanitária, contribuindo para uma maior certeza e segurança jurídicas num tal cenário. Assim, a contratação pública ao abrigo do presente Regulamento pode (i) ser conjunta com os Estados membros, através da qual os mesmos podem “adquirir, alugar ou tomar em locação na íntegra as capacidades conjuntamente contratadas”, (ii) ser feita pela Comissão Europeia, em nome dos Estados membros, com base num acordo entre ambos; e (iii) ser realizada pela Comissão Europeia, atuando como grossista, para “aquisição, armazenamento, revenda e doação de produtos e serviços, incluindo alugueres, em benefício de Estados-Membros ou organizações parceiras que selecione.” Naturalmente, este tipo de soluções coloca diversas questões que aqui não releva suscitar nem tratar.

Finalmente, o Programa não se circunscreve aos Estados membros da UE, sendo aberto aos Estados membros da EFTA (AECL) que sejam membros do Espaço Económico Europeu (EEE), mas também países em vias de adesão, países candidatos e potenciais candidatos, países da política europeia de vizinhança e, ainda, outros países terceiros que, através de um acordo específico, participem em programas da União (deixando-se, assim, a porta aberta para uma eventual participação do Reino Unido, por exemplo). Perante ameaças globais, é crucial esta abertura.   

A execução do Programa segue o Regulamento Financeiro. Mas é importante salientar a articulação com outras políticas, programas e fundos da União, tais como o Horizonte Europa ou o InvestEU. Aliás, no âmbito do Fundo Horizonte Europa – desenhado especialmente para fomentar a inovação – uma das cinco missões definidas foi a denominada Conquering Cancer, com a qual se pretende, até 2030, salvar mais de 3 milhões de vidas e proporcionar melhores condições para os pacientes enfrentarem a doença. No desenvolvimento desta missão, o aproveitamento de sinergias entre os programas será crucial.

Em suma, como se lê no preâmbulo do Regulamento, “[a] saúde é um investimento e o Programa deverá ter este princípio no seu cerne”. A UE deu, com a adoção deste Regulamento, um importante sinal, cabendo, agora, aos Estados membros e diversos stakeholders do mercado acompanharem esta tendência e aproveitarem o início do novo quadro financeiro plurianual para a construção de uma Europa mais unida e resiliente no sector da Saúde.

Guilherme Oliveira e Costa | goc@servulo.com

Maria Eduarda Fagundes | mef@servulo.com

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