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Impacto do Covid-19 nas assembleias gerais das sociedades comerciais

PUBLICAÇÕES SÉRVULO 26 Mar 2020

As circunstâncias excecionais que se vivem não podem deixar de ser tidas em conta pelos órgãos das sociedades comerciais, quer os de gestão, quer os órgãos onde têm assento os sócios.

Em Portugal, foi publicado, no passado dia 13 de março, o decreto-lei n.º 10-A/2020, diploma que estabelece medidas excecionais e temporárias relacionadas com a situação epidemiológica referida.

Com relevância para o direito societário, o artigo 18.º do decreto-lei n.º 10-A/2020 prevê que “[a]s assembleias gerais das sociedades comerciais, das associações ou das cooperativas que devam ter lugar por imposição legal ou estatutária, podem ser realizadas até 30 de junho de 2020”.

Esta medida, que, à primeira vista, parece cingir-se exclusivamente às assembleias gerais anuais das entidades jurídicas visadas (que, salvo algumas exceções, devem reunir nos primeiros três meses do ano para efeitos de apresentação das contas anuais aos sócios), suscita algumas questões no que concerne ao seu alcance, importando salientar aquelas que revestem maior pertinência e que não resultam resolvidas diretamente pelo artigo 18.º do decreto-lei n.º 10-A/2020.

A primeira questão diz respeito às assembleias gerais já convocadas. O mencionado artigo 18.º tem a virtualidade de conceder um fundamento razoável para que quem tem competência para o efeito (qualquer gerente, nas sociedades por quotas, ou o presidente da mesa da assembleia geral, nas sociedades anónimas) proceda à revogação da convocatória ou ao adiamento da reunião das assembleias gerais entretanto convocadas. Caso assim suceda, a comunicação aos sócios deverá ser feita pelo meio usado aquando da sua convocação (carta registada, publicação da convocatória, correio eletrónico com recibo de leitura ou outra forma exigida pelos respetivos estatutos), com a maior brevidade.

Outra questão (que o referido artigo 18.º do diploma acima não resolve) é o regime de convocação e realização das assembleias gerais cuja realização não é imposta por obrigação legal, mas por força da atividade normal da vida societária que, não obstante o estado de emergência declarado, continuará a desenvolver-se (p.e., nomeação de órgãos sociais, alienação do estabelecimento, aumento ou redução do capital social, dissolução de sociedades e outras alterações estatutárias).

Relativamente às assembleias gerais já convocadas, tendo em conta o fundamento que justifica o adiamento das assembleias gerais impostas por lei (o surgimento de um surto pandémico que impõe isolamento social), o mesmo será totalmente aplicável para quaisquer outras assembleias gerais. A segunda questão diz respeito às assembleias gerais (ainda) não convocadas em que os sócios pretendem discutir assuntos prementes da sociedade e que devem ser deliberados em assembleia geral, como aqueles acima explicitados.

Aqui é importante realçar que as formas de deliberação se encontram tipificadas na lei, significando por isso que os sócios não poderão deliberar por qualquer outra forma que não uma das que se encontre prevista.

Contudo, e independentemente, da forma de deliberação a adotar, a lei permite que as assembleias gerais das sociedades anónimas se realizem por meios telemáticos, “salvo disposição em contrário do contrato de sociedade” (alínea b), do n.º 6 do art. 377.º do CSC, aplicável também às sociedades por quotas). Assim, este será um “caminho” possível, a adotar neste período, em que se pretende evitar, ao máximo, as reuniões presenciais, embora com as dificuldades inerentes à respetiva operacionalização, sobretudo no caso de sociedades que têm o seu capital disperso pelo público. Assinale-se ainda que a realização de assembleias gerais por meios telemáticos implica que a sociedade “assegur[e] a autenticidade das declarações e a segurança das comunicações, procedendo ao registo do seu conteúdo e dos respetivos intervenientes”.

Mais recentemente e neste preciso sentido, o n.º 1 do artigo 5.º da recente Lei n.º 1-A/2020, publicada no dia 19.03.2020, vem precisamente privilegiar os meios telemáticos como forma de reunião de assembleias gerais, estabelecendo que “[a] participação por meios telemáticos, designadamente vídeo ou teleconferência de membros de órgãos colegiais de entidades públicas ou privadas nas respetivas reuniões, não obsta ao regular funcionamento do órgão, designadamente no que respeita a quórum e a deliberações, devendo, contudo, ficar registado na respetiva ata a forma de participação”.

O que fica por resolver é o que sucede quando os sócios não dispõem dos meios necessários à realização dessa forma de reunião.

Frederico Alves de Andrade | faa@servulo.com

Jaime Reis | jnr@servulo.com