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Simplex Urbanístico e Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos – controlo prévio das operações urbanísticas

PUBLICAÇÕES SÉRVULO 04 Abr 2024
Com a publicação do Decreto-Lei n.º 10/2024 de 8 de janeiro, o “Simplex Urbanístico” (adiante abreviadamente apenas designado “Simplex”) várias questões surgiram já sobre a conjugação de várias normas deste diploma com o Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de março, que aprovou o Regime Jurídico da Instalação, Exploração e Funcionamento dos Empreendimentos Turísticos (RJET), conforme última redação em vigor, nomeadamente as referentes às alterações ao controlo prévio do uso turístico (que serão objeto de outro update) , decorrente da eliminação da autorização de utilização, mas também questões relacionadas com o controlo prévio da construção ou alteração das edificações respetivas. 
 
As questões são tanto mais relevantes quando, como é sabido, desde 1 de janeiro é possível transacionar bens imóveis sem a apresentação da referida autorização de utilização, (artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 10/2024), regra que abrange qualquer tipo de bem imóvel, incluindo unidades de alojamento turístico. 
 
Certo é que inexiste qualquer norma no Simplex que revogue ou altere as normas do RJET sobre (i) controlo prévio dos empreendimentos turísticos e (ii) sobre o controlo do uso turístico, havendo, portanto, que compreender como conjugar as normas nestas matérias.
 
Neste update trataremos da questões relacionadas com a conjugação dos regimes em matéria de controlo prévio das operações urbanísticas em empreendimentos turísticos.
 
Com efeito, o RJET contém um regime específico quanto ao controlo prévio das operações urbanísticas associadas aos empreendimentos turísticos. De acordo com o artigo 23.º daquele diploma o procedimento respeitante à instalação dos empreendimentos turísticos segue o regime nele previsto e está submetido ao regime jurídico da urbanização e da edificação (RJUE), com as especificidades dele constantes. De acordo com a mesma norma, o procedimento aplicável à edificação de empreendimentos turísticos é o procedimento de comunicação prévia com prazo previsto no artigo 23.º-A ou, quando aplicável, a comunicação prévia prevista no RJUE, sendo que o promotor pode optar pelo procedimento de licenciamento. 
 
Entre as alterações mais significativas ao RJUE introduzidas pelo Simplex, com potenciais impactos ao nível dos empreendimentos turísticos, podemos destacar:
  • As alterações em sede de procedimentos de controlo prévio; 
  • O fim da possibilidade de o promotor optar pelo licenciamento quando as operações urbanísticas estejam sujeitas a mera comunicação prévia; 
  • O novo alcance do Pedido de Informação Prévia (PIP) favorável, que, quando cumpra os requisitos das als. a) a f) do artigo 14.º, n.º 2 (PIP “qualificado”), isenta de controlo prévio as operações urbanísticas a que respeite.
No que respeita ao procedimento de controlo prévio urbanístico parece-nos não existirem dúvidas que as normas acima citadas constituem regime especial em relação ao regime geral do RJUE e que, portanto, continuam a ter aplicação dos procedimentos especiais ali previstos, ou seja (i) a comunicação prévia com prazo do artigo 23.º-A ou (ii) quando aplicável, o regime da comunicação prévia (sem prazo) do RJUE.
 
Ou seja, sempre que relativamente a um empreendimento turístico se verificasse uma das situações previstas no artigo 4.º, n.º 4, o regime a seguir seria o da comunicação prévia do artigo 35.º do mesmo diploma. Com o Simplex, a situação mantem-se mas terá que ter-se em conta as alterações ao regime de comunicação prévia, pois passaram a estar sujeitas a este procedimento apenas as seguintes operações urbanísticas:
 
Operações de loteamento em zona abrangida por:
  • Plano de pormenor publicado após 7 de março de 1993, que contenha desenho urbano e que preveja a divisão em lotes, o número máximo de fogos e a implantação e a programação de obras de urbanização e edificação; ou
  • Unidade de execução que preveja o polígono de base para a implantação de edificações, a área de construção, a divisão em lotes, o número máximo de fogos e a implantação e programação de obras de urbanização e edificação;
As obras de urbanização e os trabalhos de remodelação de terrenos em área abrangida por:
  • Plano de pormenor publicado após 7 de março de 1993 que preveja a implantação e programação de obras de urbanização e edificação; ou
  • Operação de loteamento; ou
  • Unidade de execução que preveja a implantação e programação de obras de urbanização e edificação;
As obras de construção, de alteração ou de ampliação em área abrangida por:
  • Plano de pormenor; ou
  • Operação de loteamento; ou
  • Unidade de execução que preveja as parcelas, os alinhamentos, o polígono de base para implantação das edificações, a altura total das edificações ou a altura das fachadas, o número máximo de fogos e a área de construção e respetivos usos;
As obras de construção, de alteração exterior ou de ampliação em zona urbana consolidada que respeitem os planos municipais ou intermunicipais e das quais não resulte edificação com cércea superior à altura mais frequente das fachadas da frente edificada do lado do arruamento onde se integra a nova edificação, no troço de rua compreendido entre as duas transversais mais próximas, para um e para outro lado;
 
A edificação de piscinas associadas a edificação principal.
 
Em suma, atualmente parece que apenas nas situações em que o empreendimento turístico esteja localizado em área abrangida por plano de pormenor, operação de loteamento ou unidade de execução com as características acima descritas, haverá aplicação do regime de comunicação prévia do artigo 35.º do RJUE.
 
Surge em seguida a questão: a nova regra do n.º 6 do artigo 4.º do RJUE segundo o qual, nas operações urbanísticas sujeitas a comunicação prévia o interessado deixa de poder optar pelo licenciamento, aplica-se também aos empreendimentos turísticos? Parece-nos que a resposta deverá ser negativa atendendo à natureza de norma especial do n.º 2 do artigo 23.º do RJET que estabelece expressamente a possibilidade de recurso ao licenciamento se assim o entender o promotor. Em suma, não tendo sido expressamente revogada a referida norma, no caso dos empreendimentos turísticos, o promotor continua a poder optar pelo licenciamento, o que certamente pode garantir maior segurança ao investimento nestes casos.
 
Mais complexa é a questão de saber se poderá aplicar-se o novo regime de isenção de controlo prévio resultante de um PIP “qualificado” favorável, nos termos previstos, quer no artigo 6.º, n.º 1, al. h), quer no artigo 17.º, n.º 2 do RJUE, na versão introduzida pelo Simplex, mas, à partida, parece-nos que nada obsta a que a resposta seja positiva, na medida em não nos parece que as normas do RJET sobre controlo prévio urbanístico afastem o regime do RJUE sobre pedidos de informação prévia e seus efeitos. Por outro lado, o artigo 25.º do RJET expressamente  prevê o direito de qualquer interessado “requerer à câmara municipal informação prévia sobre a possibilidade de instalar um empreendimento turístico e quais as respetivas condicionantes urbanísticas, nos termos previstos no regime jurídico da urbanização e edificação”.
 
A aplicabilidade do regime dos PIP aos empreendimentos turísticos não suscitava dúvidas antes da entrada em vigor do Simplex (determinando a aplicação do regime de comunicação prévia do RJUE, nos termos previstos na anterior al. f) do n.º do artigo 4.º do RJUE, ao invés da comunicação prévia do artigo 23.º-A do RJET). Parece-nos que continua a não suscitar dúvidas, mas agora com o novo efeito de isenção de controlo prévio. Em suma, sempre que seja obtido um PIP favorável aos abrigo do n.º 2 do artigo 14.º do RJUE, as operações urbanísticas relativas aos empreendimentos turísticos ficarão isentas de controlo prévio. 

Filipa Névoa | fne@servulo.com 

Joana Pinto Monteiro | jpm@servulo.com