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“Watch the birdie”: auxílios públicos a companhias aéreas no contexto da COVID-19

PUBLICAÇÕES SÉRVULO 07 Mai 2020

Com o fim do estado de emergência e o retorno gradual ao “novo normal”, tornam-se evidentes os profundos danos sofridos pela nossa economia e quais os setores mais afetados.

É incontornável o impacto brutal da COVID-19 no setor da aviação. Entre restrições a voo, impostas pelo Estado e/ou encorajadas pela União Europeia, e a paralisação quase integral da atividade ou, mesmo mais recentemente, as reduções na lotação dos voos para dois terços da capacidade total (impostas pela recente Portaria n.º 106/2020, de 2 de maio), é impressiva e incomparável a quebra das receitas das companhias aéreas. E para remediar estas situações, alguns Estados membros têm-se visto obrigados a adotar auxílios públicos a favor de companhias aéreas, nomeadamente ao abrigo do Quadro Temporário que a Comissão Europeia adotou.

A primeira medida foi adotada pela França, que estabeleceu um sistema de diferimento de pagamento de certas taxas aeronáuticas cobradas a companhias aéreas. As taxas, que normalmente seriam devidas entre março e dezembro de 2020, passariam a ser devidas a partir de 1 de janeiro de 2021. O regime ainda prevê a possibilidade de diferir o pagamento de impostos por um período de 24 meses. O objetivo do esquema é reduzir a pressão no cash flow das companhias aéreas.

A Suécia também propôs uma medida, que consiste na concessão de garantias estatais a empréstimos das companhias aéreas, que tem sido a resposta mais habitual. No caso, beneficiariam 20 empresas, incluindo companhias aéreas que oferecem voos programados, companhias aéreas mais pequenas que operam voos de ambulância e companhias de helicópteros que realizam serviços de inspeção. O seu objetivo é limitar o risco associado à concessão de empréstimos, mantendo o seu envolvimento na resposta à crise, ao mesmo tempo que lhes permitia manter a liquidez e até alguma atividade, durante e após a pandemia.

Já a Dinamarca optou por um auxílio individual à Scandinavian Airlines System (SAS), no valor de 137 milhões de euros. Objetivo: compensar as perdas de operação sofridas pela empresa durante o período da crise. Mas continuava a ser uma garantia (e não um auxílio direto) a um financiamento em sistema de conta corrente. A garantia, contudo, é limitada pela avaliação dos danos sofridos pela empresa. Esta companhia, aliás, beneficiou de igual auxílio da Suécia. Ambos para reparar prejuízos sofridos, cujos critérios de aprovação são de reduzida discricionariedade para a Comissão Europeia.

A Alemanha notificou um auxílio de 550 milhões de euros, com o mesmo fundamento, em favor da Condor. Também sob a forma de garantia a um empréstimo concedido por um banco de fomento alemão. E também limitado pelo montante dos danos sofridos.

A França notificou um auxilio de 7 mil milhões de euros à Air France, referindo as suas funções mundiais no setor da aviação, bem como o eventual impacto negativo que que resultaria da sua insolvência. Por um lado, envolve uma garantia de Estado que cobre até 90% de financiamento a obter até ao final de 2020 (valor superior aos típicos 70% previstos no regime geral de garantia francês). Mas, mais inovatoriamente, é concedido um empréstimo acionista subordinado à Air France por parte do Estado, como acionista.

Estas medidas são particularmente disruptivas face ao regime dos auxílios ao transporte aéreo, previsto no artigo 93.º do Tratado e desenvolvido nas Orientações relativas a auxílios estatais a aeroportos e companhias aéreas da Comissão Europeia.

Face ao, nunca antes visto, decréscimo prolongado do tráfego aéreo, as empresas do setor continuarão a enfrentar violentas dificuldades em assegurar a sustentabilidade das operações e a minimizar os impactos financeiros sofridos. Prevê-se que muitos outros Estados membros vão subindo por estes caminhos aéreos. Sob pena de prejuízos irreparáveis para as economias e os Estados. Fica ainda no ar a possibilidade de o Estado Português recorrer a este mecanismo para solucionar os naturais problemas que a TAP tem sentido na presente pandemia.

Francisco Marques de Azevedo | fma@servulo.com

Michael Sean-Boniface | msb@servulo.com