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As alterações ao Código Penal pela Lei n.º 54/2023, de 4 de setembro

SÉRVULO PUBLICATIONS 09 Nov 2023

No passado dia 5 de setembro de 2023, entrou em vigor a Lei n.º 54/2023, de 4 de setembro, que criou o regime jurídico aplicável ao controlo e fiscalização do pessoal crítico para a segurança da aviação civil (“pessoal crítico”) em exercício de funções sob influência de álcool, estupefacientes ou substâncias psicotrópicas. 

Este diploma legal vem estabelecer a proibição de exercer funções sob influência de álcool (i.e., apresentando um teor de álcool no sangue igual ou superior a 0,2 g/l), estupefacientes ou substâncias psicotrópicas (nos valores mínimos de concentração fixados no Anexo I à Lei em análise) ao «pessoal crítico para a segurança da aviação civil». Este conceito é definido como «as pessoas que podem pôr em perigo a segurança da aviação civil se não cumprirem as suas obrigações ou se desempenharem as suas funções de forma inadequada, incluindo a tripulação das aeronaves, os pilotos remotos de aeronaves não tripuladas, o pessoal afeto à manutenção das aeronaves, os controladores de tráfego aéreo, os agentes de informação de tráfego de aeródromo, os oficiais de operações de voo, o pessoal que efetua rastreios de segurança contra atos de interferência ilícita na aviação civil e qualquer outro pessoal que circule na área de movimento dos aeródromos.» 

Por forma a controlar e fiscalizar o cumprimento desta proibição, estatui a Lei n.º 54/2023, entre outras disposições, a obrigatoriedade e os termos de submissão a provas para deteção do estado de influência por álcool, estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, sob pena de se incorrer em um crime de desobediência qualificada, previsto e punível pelo artigo 348.º, n.os 1 e 2, do Código Penal. Em caso de acidente grave, tal obrigatoriedade é ainda estendida a terceiros intervenientes no mesmo. Resulta ainda da Lei em análise um dever de reporte à Autoridade Nacional de Aviação Civil, no prazo máximo de cinco dias úteis, por parte dos operadores aéreos que se dediquem ao transporte aéreo comercial, bem como os que se dediquem ao trabalho aéreo ou operações especializadas, das situações de desempenho de funções de algum membro das suas tripulações sob a influência de álcool, estupefacientes ou substâncias psicotrópicas. 

Já para efeitos da punição pelo incumprimento das suas disposições, a Lei n.º 54/2023 qualifica como contraordenações, graves e muito graves, para efeitos do Regime das Contraordenações Aeronáuticas Civis, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2004, de 9 de janeiro, diversas condutas contrárias às mesmas. Prevê igualmente, para além de medidas cautelares, a aplicação de sanções acessórias de interdição temporária do exercício de atividade e de publicidade da punição por contraordenação, nos termos daquele regime. 

Veio também a Lei n.º 54/2023  alterar o Código Penal através do aditamento de um novo crime (artigo 292.º-A): o exercício de funções como elemento do pessoal crítico, que se reconduza, concretamente, a tripulação das aeronaves, pilotos remotos de aeronaves não tripuladas, pessoal afeto à manutenção das aeronaves, controladores de tráfego aéreo, agentes de informação de tráfego de aeródromo, oficiais de operações de voo, pessoal que efetua rastreios de segurança contra atos de interferência ilícita na aviação civil ou demais pessoal que desempenhe funções na área de movimento dos aeródromos, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,9 g/l, ou bem assim, sob influência de estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou produtos com efeito análogo perturbadores da aptidão física, mental ou psicológica. A prática de tal crime, pelo menos por negligência, é agora punível com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias. 

Por sua vez, nos termos do artigo 26.º, n.º 1, alínea a), ponto iii), da Lei n.º 54/2023, os elementos do pessoal crítico que não se enquadrem no âmbito de autoria do crime acima descrito, mas ainda assim possam «pôr em perigo a segurança da aviação civil se não cumprirem as suas obrigações ou se desempenharem as suas funções de forma inadequada» e exerçam funções com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,9 g/l ousob influência de estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou produtos com efeito análogo perturbadores da aptidão física, mental ou psicológica, incorrerão antes na prática de uma contraordenação muito grave, para efeitos do já referido Regime das Contraordenações Aeronáuticas Civis. 

De forma consequente, a mesma Lei procedeu à alteração dos artigos 69.º e 101.º do Código Penal, anteriormente relativos apenas à condução de veículos com motor, por forma a abrangerem, expressa e especificamente, a condução de aeronaves com ou sem motor. 

Assim, prevê agora o artigo 69.º a aplicação da pena acessória de proibição de pilotar aeronaves com ou sem motor, a par da punição pela prática de determinados crimes, nomeadamente, o que vem agora previsto no novo artigo 292.º-A, e bem assim, o crime de desobediência qualificada pela recusa de submissão às já referidas provas para deteção de pilotagem de aeronave com ou sem motor sob efeito de álcool, estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou produtos com efeito análogo. 

Já o artigo 101.º passa a dispor que, em caso de condenação por crime praticado na pilotagem de aeronave com ou sem motor ou com grosseira violação dos deveres que a um piloto incumbem, o tribunal decreta a cassação do respetivo título de licença ou pilotagem quando houver fundado receio de que a pessoa venha praticar outros factos da mesma espécie, ou deva ser considerada inapta para a pilotagem de aeronave com ou sem motor, conclusão para a qual contribui, entre outros, a prática do crime ora previsto no artigo 292.º-A do Código Penal.

 

 Teresa Serra | ts@servulo.com

Inês Pereira Lopes | ipl@servulo.com