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COVID-19: O impacto significativo no funcionamento da Administração

SÉRVULO PUBLICATIONS 19 Mar 2020

A situação epidemiológica do novo Coronavírus - COVID 19 tem tido um impacto significativo no funcionamento da Administração, em que se incluem os municípios e as entidades exteriores àqueles, com competências em procedimentos de controlo prévio de operações urbanísticas e de avaliação de impacte ambiental (AIA) de projetos.

No passado dia 13 de março foi publicado o Decreto-Lei n.º 10-A/2020, que estabelece medidas excecionais e temporárias relativas à situação epidemiológica em curso. Este diploma determina a suspensão dos prazos de cujo decurso decorra o deferimento tácito pela administração (i) de autorizações e licenciamentos requeridos por particulares e (ii) de autorizações e licenciamentos, ainda que não requeridos por particulares, no âmbito da avaliação de impacte ambiental.

O Decreto-Lei n.º 10-A/2020 entrou em vigor no dia 14 de março e produz de efeitos desde 9 de março de 2020 no que toca aos aspectos (i) e (ii) acima referidos (cfr. artigos 17.º, 36.º e 37.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020).

As principais consequências deste diploma verificam-se ao nível da aplicação do regime jurídico da urbanização (RJUE), e da aplicação do regime jurídico de avaliação de impacte ambiental (RJAIA). O primeiro regula os procedimentos de controlo prévio de operações urbanísticas, com especial destaque para o licenciamento e autorização de utilização (ou alteração de utilização). O segundo regula o procedimento de avaliação de impacte ambiental, mediante a apresentação de um estudo de impacte ambiental, a dar lugar a uma declaração de impacte ambiental (DIA) e à eventual verificação da conformidade do projeto de execução com esta declaração.

O ato de licenciamento ou de autorização de projetos abrangidos pelo RJAIA só pode, sob pena de nulidade, ser emitido, designadamente: 

  1. Após a notificação da DIA, favorável ou favorável condicionada, no caso de projetos sujeitos a AIA em fase de projeto de execução, ou após o decurso do(s) prazo(s) abaixo referidos para a emissão da DIA, sem que a decisão expressa seja notificada à entidade licenciadora ou competente para a autorização e ao proponente; 
  1. Após notificação da decisão favorável sobre a conformidade ambiental do projeto de execução, no caso de projetos sujeitos a AIA em fase de estudo prévio ou anteprojeto, ou após o decurso do prazo abaixo referido, sem que a decisão expressa seja notificada à entidade licenciadora ou competente para a autorização e ao proponente. 
  1. Suspensão de prazos no âmbito do RJUE

O RJUE trata o silêncio da Administração em dois níveis distintos. O primeiro nível diz respeito aos atos que, devendo ser praticados por qualquer órgão municipal no âmbito do procedimento de licenciamento, não o são. Neste caso, os interessados podem recorrer à figura da intimação judicial para a prática de ato legalmente devido, deduzindo junto dos tribunais administrativos um pedido de intimação dirigido à interpelação da entidade competente para o cumprimento do dever de decisão. Na decisão, o juiz estabelece um prazo para o cumprimento do dever de decisão e fixa sanção pecuniária compulsória. Decorrido o prazo fixado pelo tribunal sem que se mostre praticado o ato devido, o interessado pode prevalecer-se do deferimento tácito previsto no RJUE. 

O segundo nível diz respeito a quaisquer outros atos, que tendo de ser praticados, não o são. Neste caso, considera-se tacitamente deferida a pretensão, com as consequências gerais. Este deferimento tácito assume relevância, por exemplo, no caso da emissão da autorização de utilização de edifícios ou da alteração da sua utilização. 

Na prática, e na medida em que não especifica o procedimento ou processo de onde o deferimento tácito decorrerá, o Decreto-Lei n.º 10-A/2020 prejudicará, quer a utilidade da intimação judicial acima referida, no que toca ao licenciamento, quer o deferimento tácito de outros pedidos, por exemplo, no que toca a autorizações de utilização ou alterações de utilização. 

Trata-se, assim, de uma medida com impacte significativo no licenciamento e autorização de operações urbanísticas. 

  1. Suspensão de prazos no âmbito do RJAIA 

O impacte acima referido também se verifica no âmbito da aplicação do RJAIA, designadamente, no contexto dos principais prazos de cujo decurso decorre o deferimento tácito pela administração. Este prazos são fixados em dois âmbitos diversos: (i) o(s) prazo(s) para a emissão da DIA; (ii) o prazo para a decisão sobre a conformidade ambiental do projeto de execução. 

A DIA é, em regra, emitida pela autoridade de AIA e notificada à entidade licenciadora ou competente para a autorização do projeto e ao respetivo proponente. A DIA é emitida em prazos distintos, consoante se trate de uma situação mais comum, de projetos sujeitos ao regime de acesso e exercício de atividade industrial e projetos de potencial interesse nacional ou ainda quando haja lugar à intervenção da entidade acreditada para verificação da conformidade do EIA. 

Por outro lado, a decisão sobre a conformidade ambiental do projeto de execução também obedece a um determinado prazo sendo, em regra, emitida pela autoridade de AIA, tendo em conta os pareceres técnicos emitidos e o relatório de consulta pública, a qual é notificada à entidade licenciadora ou competente para a autorização e ao proponente. 

Os prazos para a verificação do deferimento tácito no âmbito da emissão da DIA ou da decisão sobre a conformidade ambiental do projeto de execução encontram-se suspensos por força do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, o que, na prática, equivalerá em alguns casos à suspensão do procedimento de AIA propriamente dito. 

Atendendo à expectável alteração do enquadramento urbanístico do território nacional até ao dia 13 de julho de 2020, a suspensão dos prazos operada pelo Decreto-Lei n.º 10-A/2020 poderá implicar reflexos em projetos que se encontrem em curso e que se previa que viriam a ser objeto de DIA favorável ou de licenciamento antes dessa data (cfr. Lei n.º 31/2014, de 30 de maio, que estabelece as bases gerais da política pública de solos, de ordenamento do território e de urbanismo).

Eduardo Gonçalves Rodrigues | egr@servulo.com