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Critérios Ecológicos das Compras Públicas

SÉRVULO PUBLICATIONS 15 Nov 2023

(Resolução do Conselho de Ministros n.º 132/2023, de 25 de outubro) 

I. No seguimento da aprovação da Estratégia Nacional para as Compras Públicas Ecológicas 2023 (ECO360)[1], foi publicada, em 25 de outubro, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 132/2023 (RCM), que define critérios ecológicos específicos para os procedimentos de formação de um conjunto de contratos públicos promovidos por entidades da administração direta e indireta do Estado, incluindo do setor empresarial do Estado.

Os critérios ecológicos especificamente previstos na RCM reportam-se não apenas a contratos públicos de empreitada de obras públicas (com e sem utilização de madeira e cortiça), como também a contratos públicos de aquisição de:

i. Peças de vestuário;

ii. Madeira e cortiça;

iii. Eletricidade, incluindo para postos públicos de eletricidade para mobilidade elétrica:

iv. Serviços de certificação energética, auditoria energética e projeto, bem como de aquisição e instalação de sistema fotovoltaico de autoconsumo;

v. Veículos e contratos de aluguer operacional de veículos;

vi. Papel para fotocópia e impressão;

vii. Mobiliário;

viii. Serviços de higiene e limpeza;

ix. Serviços de agenciamento de viagens e alojamento;

x. Serviços de manutenção de sistemas de aquecimento, ventilação e ar condicionado;

xi. Serviços de manutenção de instalações de sistemas de elevação e escadas rolantes;

xii. Serviços de cópia e impressão em regime de outsourcing, bem como contratos de aquisição de equipamentos de cópia e impressão;

xiii. Equipamento informático ou contratos de locação de equipamento informático;

xiv. Produtos alimentares, serviços de catering e serviços de venda automática, bem como serviços de refeições confecionadas.

II. De acordo com a sua natureza, os critérios ecológicos previstos para cada um dos objetos contratuais acima identificados distinguem-se em:

i. Obrigatórios – a entidade adjudicante é obrigada a utilizar o critério ecológico especificamente previsto, salvo se da sua aplicação resultar uma restrição sensível da concorrência;

ii. Voluntários – a entidade adjudicante não está obrigada a utilizar o critério ecológico especificamente previsto, salvo se pretender utilizar critérios ecológicos, caso em que deve usar os previstos na RCM;

iii. Recomendáveis – a entidade adjudicante só está dispensada de utilizar os critérios ecológicos especificamente previstos em casos especialmente fundamentados; e

iv. Eventuais – a entidade adjudicante não está obrigada a utilizar os critérios ecológicos especificamente previstos na RCM.

Veja-se, a título de exemplo, que o critério de adjudicação da proposta economicamente mais vantajosa na modalidade multifator foi previsto, nos contratos acima elencados e consoante os casos, como obrigatório ou recomendável. Portanto: as entidades adjudicantes só estarão dispensadas de adotar um critério multifator nos procedimentos pré-contratuais tendentes à celebração de contratos com os objetos acima elencados caso consigam fundamentar que, da sua utilização, resultaria uma restrição significativa da concorrência (no caso de critérios obrigatórios) ou que a verificação de uma especial circunstância permite dispensar a sua adoção (no caso de critérios recomendáveis).

III. Já no que diz respeito ao âmbito de aplicação dos referidos critérios, os mesmos podem incidir sobre quatro áreas, a saber:

i. Critério de qualificação – requisitos de capacidade técnica a definir no âmbito de procedimentos que abranjam uma fase de prévia qualificação (como, por exemplo, o concurso limitado);

ii. Critério de adjudicação – por referência às modalidades previstas no n.º 1 do artigo 74.º do Código dos Contratos Públicos (a saber, monofator e multifator);

iii. Fatores/subfatores do critério de adjudicação – aspetos da execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, medidos no modelo de avaliação das propostas, balizáveis por parâmetros base e correspondentes aos atributos constantes das propostas a apresentar pelos concorrentes;

iv. Aspetos da execução do contrato e especificações técnicas – referentes às características das obras, bens ou serviços a adquirir, aos métodos de construção dessas obras, produção desses bens ou prestação desses serviços, a exigências de desempenho ou a requisitos funcionais, ou seja, às condições da execução do objeto contratual fixadas no caderno de encargos (i.e., não submetidas à concorrência). 

IV. Acresce ainda que, a RCM impõe que as entidades adjudicantes atendam à sustentabilidade ecológica das prestações objeto dos contratos a celebrar, independentemente de se reconduzirem a um dos objetos contratuais acima elencados (incluindo contratos atípicos). Para o efeito, estabelece, ainda que a título preferencial, um conjunto de princípios orientadores da preparação das peças de qualquer procedimento pré-contratual público (“princípios gerais aplicáveis em matéria ecológica”), a saber:

i. A adoção da modalidade multifator no critério de adjudicação;

ii. A inclusão de fatores de sustentabilidade ambiental sempre que seja adotada a modalidade multifator do critério de adjudicação;

iii. A fixação de especificações técnicas por referência a standards mínimos de sustentabilidade ambiental, bem como a certificações emitidas por sistemas de reconhecida fiabilidade (por exemplo, o Rótulo Ecológico da União Europeia).

V. Os critérios ecológicos especificamente previstos na RCM apenas são aplicáveis a partir do primeiro dia útil do segundo trimestre de 2024, ou sejam, só se aplicam aos procedimentos cuja decisão de contratar seja tomada a partir do dia 1 de abril de 2024. Existem, porém, duas exceções a esta regra:

i. Os procedimentos pré-contratuais tendentes à celebração de contratos de empreitadas de obras públicas cujos projetos de execução sejam contratados após 1 de janeiro de 2024 - nesses casos, os critérios ecológicos previstos na RCM aplicam-se a partir dessa data (tendo em conta que a RCM não distingue os tipos de contratos de empreitada, esta exceção parece abranger também os contratos de conceção-construção);

ii. Os procedimentos pré-contratuais tendentes à celebração de contratos ao abrigo de sistemas de aquisição dinâmicos e de acordos-quadro vigentes ou cujos procedimentos pré-contratuais tenham sido iniciados antes de 1 de janeiro de 2024.

Ademais, os critérios ecológicos especificamente previstos na RCM não são aplicáveis quando em anterior concurso público, ou concurso limitado por prévia qualificação, nenhum concorrente tenha apresentado proposta ou todas as propostas tenham sido excluídas por incumprimento dos critérios ecológicos adotados.

Já quanto à entrada em vigor dos “princípios gerais aplicáveis em matéria ecológica”, atendendo à remissão do n.º 7 da RCM exclusivamente para o n.º 1 e à redação conferida ao n.º 2 da RCM, reside a dúvida sobre se esta estará indexada à entrada em vigor dos critérios ou, pelo contrário, se já ocorreu em 26 de outubro de 2023. 

VI. A fixação deste tipo de critérios ecológicos segue uma tendência legislativa (quer ao nível da regulamentação setorial europeia, quer ao nível da legislação nacional de um crescente número de Estados Membros da UE) no sentido de se passar das tradicionais regras formais de contratação pública relativas a “como comprar” (how to buy) para regras modernas materiais relativas a “o que comprar” (what to buy). Esta tendência implica, necessariamente, uma redução da margem de discricionariedade das entidades adjudicantes no que diz respeito à conformação da decisão de contratar em cada caso concreto. 

Paula Bordalo Faustino | pbf@servulo.com

Mariana Trigo Pereira | mtp@servulo.com

 

[1] Através da Resolução de Conselho de Ministros n.º 13/2023, de 10 de fevereiro.

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